terça-feira, 12 de março de 2024

Tem que ir matar pai, mãe, família' e 'tô feliz demais': áudios mostram interações entre PMs suspeitos de chacina em PE; 12 militares foram denunciados e 5 estão presos

 


As investigações que embasam a denúncia do Ministério Público de Pernambuco contra 12 policiais militares que teriam promovido uma chacina por vingança no município de Camaragibe, na madrugada de 15 de setembro do ano passado, levam em consideração não apenas a localização dos agentes naquele dia, obtida por sinais de telefone, como também uma série de troca de mensagens de texto e de voz entre eles. Nas conversas, os agentes juravam as vítimas de morte e traçavam estratégias para caçar e executar Alex da Silva Barbosa, de 33 anos, conhecido como Alex Samurai, que algumas horas antes havia matado o soldado Eduardo Roque Barbosa de Santana e o cabo Rodolfo José da Silva, ambos do 20ºBPM, durante troca de tiros.


O inquérito da Polícia Civil destaca uma série de conversas em que os suspeitos, inclusive, comemoram após a morte das vítimas. Trechos dos diálogos foram obtidos e publicado pelo Jornal do Commercio.


CONFIRA ABAIXO AS TRANSCRIÇÕES







"Véi, se foi mesmo, eu tô feliz, viu? Eu tô feliz, pô, tem que ser assim mesmo, pô, mexeu com a gente, a gente tem que ir, matar pai, mãe, família, quem tiver que matar mesmo (...) tem que arregaçar a família dele (...) tô feliz demais, pense na alegria, hoje o inferno tá feliz", diz em áudio um dos PMs, não identificado.

A denúncia, à qual O GLOBO teve acesso, diz respeito às execuções de Amerson Juliano da Silva, Agata Ayanne da Silva e Apuynã Lucas da Silva — três irmãos de Alex Samurai. O crime foi todo filmado e transmitido numa live pelo celular de uma das vítimas, que iniciou a gravação na tentativa de impedir a ação dos assassinos, sem sucesso. Além deles, também morreram: Alex, o principal alvo dos assassinos; a mãe dele, Maria José Pereira da Silva; a esposa dele, Maria Nathália Campelo do Nascimento; e Ana Letícia, uma vizinha atingida durante a troca de tiros que deu início à série de eventos.


Os denunciados pela chacina são:

  • O tenente-coronel Fábio Roberto Rufino da Silva
  • O tenente-coronel Marcos Túlio Gonçalves Martins Pacheco
  • O tenente João Thiago Aureliano Pedrosa Soares
  • Os soldados Leilane Barbosa Albuquerque, Emanuel de Souza Rocha Júnior, Diego Galdino Gomes e Paulo Henrique Ferreira Dias, conhecido como Rato
  • Os cabos Dorival Alves Cabral Filho, Fábio Júnior de Oliveira Borba e Janecleia Izabel Barbosa da Silva, conhecida como Jane
  • Os sargentos Eduardo de Araújo Silva e Cesar Augusto da Silva Roseno, conhecido como Milionário

Abordagem, mortes de policiais e vingança

No dia 14 de setembro de 2023, policiais militares foram até a residência de Alex, no bairro Tabatinga, onde havia uma denúncia de que alguém estaria efetuando disparos para o alto. Quando chegaram, o homem tentou fugir e houve troca de tiros, que terminou com a morte de dois PMs e duas pessoas baleadas: a grávida Ana Letícia Carias da Silva — que morreria dias depois — e o adolescente Daniel Orlando da Silva, ambos moradores de uma casa vizinha.

A denúncia narra que, a partir daí, vários policiais militares se deslocaram até o bairro de Tabatinga, sob o comando, instrução e monitoramento de oficiais da PM, onde iniciaram "uma verdadeira caçada" a Alex e a parentes dele, "com claro intuito homicida", em vingança pela morte dos dois policiais.

Os promotores afirmam que, naquela noite, o tenente-coronel Marcos Túlio convocou o tenente Thiago Aureliano, além de outros policiais — inclusive de folga —, para uma reunião nas proximidades da Faculdade de Odontologia de Pernambuco, onde também estavam o tenente-coronel Fábio Rufino, que era o comandante do batalhão, e os demais denunciados. Todos estariam à paisana, com veículos descaracterizados, balaclavas e armas "cabrito" (não oficiais). "Sabiam que não se tratava de uma missão oficial", narram. Foi através de "intensa troca de mensagens em grupos de WhatsApp", segundo o MP, que os policiais conseguiram informações aprofundadas sobre Alex Samurai e todos os seus parentes.

A mãe de Alex, Maria José Pereira da Silva, a esposa dele e Maria Nathália Campelo do Nascimento teriam sido as primeiras vítimas, abordadas dentro de casa. Os corpos delas seriam encontrados já durante a manhã, num canavial em Paudalho.

Mas os policiais descobriram ainda que uma pessoa estava planejando ajudar Alex a fugir, a partir de um terreiro na comunidade de Ladeira das Pedrinhas. Os PMs denunciados, então, seguiram em carros descaracterizados até o local, na mesma noite, onde teriam encontrado uma cunhada de Alex e suas duas filhas, de 10 e 11 anos, a bordo de um carro de aplicativo, parado em frente ao portão da casa dela.

Eles deixaram as crianças no carro e abordaram a mulher e o motorista, que, narra a denúncia, teriam sido torturados. Rendida dentro de casa, a cunhada teria sido ameaçada para que atraísse seu marido e Alex, o alvo principal, até lá. Depois de sofrer muita violência por parte dos suspeitos fortemente armados, ela acabou atraindo Amerson por telefone até uma rua próxima.

A essa altura, narram os promotores, Amerson estava junto aos outros dois irmãos, Agata e Apuynã, procurando pela mãe deles e pela esposa de Alex, que haviam desaparecido. Eles tinham, inclusive, pedido ajuda em um grupo da Polícia Militar. Quando chegaram de carro ao local da emboscada, indicado pelos criminosos, logo foram abordados e obrigados a descer do veículo.

Ágata, na tentativa de evitar que os policiais a matassem ou matassem seus dois irmãos, passou então a transmitir toda a situação numa live pelo Instagram. "No vídeo, verifica-se que Amerson afirma por diversas vezes que havia câmeras no local, após obedecer às ordens dos denunciados, colocando as mãos na cabeça e se ajoelhando, quando então é covardemente alvejado por diversos disparos", narra a denúncia. Em seguida, Ágata também é atingida por vários tiros e o celular, no chão, continua gravando as imagens. Apuynã é o último a ser morto. "Ele suplica pela vida, podendo-se ouvir a sua voz pedindo por favor e dizendo que nada tinha a ver que justificasse aquilo", acrescenta o MP


Ágata foi baleada na cervical e no tórax. Amerson foi atingido por disparos na cabeça, na região cervical e no abdômen. Apuynã foi ferido no peito, abdômen e na perna. Chegou a ser socorrido com vida à UPA Caxangá, mas não resistiu aos ferimentos.

Mensagens apagadas

"Os indícios de autoria também se revelam fortes e estão consubstanciados, em especial, nos relatórios técnicos elaborados a partir da análise de dados telefônicos e telemáticos, obtidos através de autorização judicial, relativamente aos ora denunciados e outros alvos das investigações", acrescenta o MP. "Os referidos relatórios comprovam claramente que os denunciados agiram de forma concatenada, com evidente intenção de caçada homicida, ao suspeito Alex e parentes dele, em vingança à morte dos dois policiais", prossegue o texto.

O MP narra ainda que, após a chacina, o que se viu foram ações tendentes ao acobertamento dos crimes e proteção aos executores: "Houve cuidado dos oficiais acusados para um certo distanciamento das execuções, o que, ao contrário da impressão que queriam causar, é mais uma circunstância indicativa da consciência e planejamento da finalidade da ação homicida. O apagamento de mensagens trocadas pelo WhatsApp durante aquela noite/madrugada; as ordens expressas para recuar ou retrair parte da equipe no calor da execução das vítimas; a inação ou a falta de comando para perseguição aos executores do triplo homicídio, são exemplos de atitudes de quem efetivamente participou da empreitada".


Com informações de O Globo e Jornal do Commercio

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